Críticas

Nesse espaço você encontra textos críticos escritos sobre os espetáculos apresentados durante o Festival Brasileiro de Teatro Toni Cunha, de Itajaí (SC):


Fotos: SECOM / Itajaí
Um espetáculo carregado de cores locais e de comicidade
Crítica da peça Como nasce um cabra da peste, da Agitada Gang
por Humberto Giancristofaro, Mariana Barcelos e Dâmaris Grün

Como nasce um cabra da peste é uma peça que lança mão do imaginário do retirante para transmitir as forças que perpassam suas vidas secas. Seguindo de forma muito bem humorada o lema de que o sertanejo é antes de tudo um forte, a peça trata da cultura ao redor do fenômeno do parto numa família do interior da Paraíba. Numa curva dramática que começa com indicadores mais comuns à todos, como uma conversa sobre o formato da barriga como diagnóstico do gênero do bebe, a peça entra em características cada vez mais particulares da crença e que aos olhos do distanciamento beiram ao absurdo. Mas todas as crendices, simpatias, patuás e macumbas que formam a riqueza cultural com a qual a peça brinca são de fato um pout-pourri da cultura popular nordestina. Para compor esse texto os integrantes da companhia teatral Agitada Gang de João Pessoa, muitas vezes lançaram mão de experiências pessoais como a do jovem que guarda o sorvete na mala para apreciá-lo mais tarde. Essa abordagem regional montada pelo grupo há uma década preserva um olhar naife da sua própria região que hoje enfrenta a aculturação da globalização.

A comicidade, entretanto, não encobre a precariedade das condições de vida desses personagens. Para que o segundo filho nasça o primeiro precisa ir embora de casa, com uma trouxinha de roupa, ainda criança. A cena é a mais direta acerca do movimento cíclico da dramaturgia, que antes da chegada do bebê, já se anuncia seu futuro. O filho continua a trajetória dos pais, de andarilhos do sertão, vagando de cidade em cidade, tentado sobreviver. O cenário, composto de amontoados de gravetos, espelham as margens das estradas com árvores secas do interior nordestino. É tudo precário, escasso, sofrido, então há humor, porque este parece ser o remédio. Mas por detrás da linha cômica que mantém a encenação distante da dor dos personagens, existe um sertão real, não romantizado, nem fixado na miséria, nem na cultura local. Um olhar nada carregado de estigmas que o posicionamento crítico de quem não viveu no sertão produz. A Agitada Gang nos traz a imagem do sertão vista de dentro, o que proporciona um excelente exercício comparativo entre o que eles vêem e o que nos contam. Entre o que é e o que imaginamos ser.

É importante destacar que a companhia paraibana trabalha basicamente com teatro infantil e desenvolve como base de seu trabalho a linguagem clownesca. Mesmo que o espetáculo em questão não materialize essa linguagem de forma concreta e evidente, é possível verificarmos influências dos palhaços de cada ator ali do grupo na medida em que trazem uma representação dos tipos do sertão. O menino matuto, a mãe e o pai retirantes e caminhantes, a parteira com suas crendices estão presentes no espetáculo de forma concreta e com muita propriedade. Os atores conferem trejeitos a seus personagens que aludem ao riso constante do púbico. Eles criam tipos típicos do imaginário nordestino que não caem no rasteiro estereótipo, mas aparecem com propriedade através de trejeitos, movimentos e falas que se dão de forma orgânica na composição atorial. E fica evidente a natureza clownesca nas composições e na direção do espetáculo. A cenografia, o figurino e a trilha sonora contribuem para que o universo sertanejo e retirante se concretizem de maneira funcional, já que a simplicidade na dramaturgia quer antes apresentar a situação jocosa e quase estapafúrdia do casal retirante. Os elementos constitutivos da cena favorecem e reforçam a comicidade que a companhia encontra sobre tal assunto. Os tipos nordestinos retratados em cena e a sua lida com a realidade a eles imposta faz emergir uma comicidade crítica sim, mas nada dura.


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Fotos: SECOM / Itajaí
Um solo acompanhado
Crítica da peça Luisa, da Cia. Experimentus Teatrais
por Dâmaris Grün

A atriz Sandra Knoll recebe os espectadores no palco do teatro da Casa de Cultura Dide Brandão como a sala de casa. O que se avista ao adentrar o palco é uma mulher de expressão triste, mas que sorri intensamente para cada espectador que ali se acolhe. Lembrança e dor serão ali expostas e partilhadas. A mulher se chama Luisa e dá nome ao espetáculo. Ela está esperando o homem amado por mais de dez anos e finalmente chega ao dia de reencontrá-lo. É a partir desse reencontro que a personagem rememora sua vida afetiva, atravessada pela lembrança forte de seu pai em contraponto ao "acerto de contas" com Augustin. O exercício da lembrança é o cerne desse trabalho e opera uma presentificação das memórias e imagens desses dois homens na vida da personagem de Daniel Veronese, autor do texto e importante dramaturgo e diretor argentino. A dramaturgia tece um emaranhado monológico cambiante entre o real encontro de Luisa com Augustin e (a partir dessa espera e reencontro) as memórias de seu pai desencadeadas nesse fluxo delirante da personagem. Essa dramaturgia faz ver em Luisa estratos de humanidade que capturam o espectador para junto da personagem numa relação cúmplice e afetiva, já que um sentimento de compaixão pela situação daquela mulher tão doída em seus afetos brota na relação entre cena e plateia.

Do solo emerge uma mulher que se encontra sozinha na vida de suas rememorações e anseios. As memórias do pai como a carteirinha e a flâmula do time de coração dele, o hino entoado em cena, a pasta de trabalho, o relógio antigo, materializam sua forte presença. Ao trazer essas relíquias afetivas e familiares ela materializa o homem ao seu lado, o pai e seu duplo, Augustin. As lembranças na cena que se referem a Augustin - na espera ou o reencontro, e isso não fica tão evidente, há uma sugestão maior do que o fato - são partilhadas com o espectador que está muito próximo da cena, próximo de Luisa, próximo da atriz. Ele, o espectador, acompanha o solo emocionado e carregado de angústias de uma mulher que antes de tudo, encontra-se só. Nem Augustin, nem o pai: sua companhia são as memórias e o espectador a sua frente.

O espaço da cena se reduz a um caixote que remete a uma caixa de luz. Esse caixote vira baú de onde a atriz retira objetos que partilha com a expectação. Há uma parede de treliça, muito pequena, que serve para apoio de longos fios elétricos que são luminárias moventes e manipuladas pela atriz. Esse espaço é completado pelas cadeiras ocupadas pelo espectador de forma próxima a ponto dele sentir-se cúmplice da ação. Essa aproximação possibilita que o sentimento de compaixão da recepção se dê no presente da ação e faça com que Luisa não esteja tão só, como suas palavras e memórias reiteram, pois a presença do aqui e agora do espectador se dá de forma viva e contundente.

Sandra Knoll representa uma Luisa entorpecida pelas lembranças e remoída pela ausência de Augustin. A atriz constrói um corpo delicado para a personagem, com gestos leves e miúdos que retificam a fragilidade da situação. O estatuto de representação nesse solo cria um distanciamento entre a atriz e a personagem de Veronese. Mas ao trazer as lembranças materiais do time de futebol do pai é evidente que se concretiza um laço afetivo em que a matéria documental, a memória pessoal da artista está ali em jogo. É ao compartilhar esse mundo pessoal - afetivo com o espectador que se cria no trabalho uma interação entre cena e expectação cúmplice e participativa, mas sem alardes. Olhar de perto documentos, fotos, livros e etc. do mundo da personagem é que possibilita ao espetáculo um caráter de solo acompanhado, pois à expectação é dado um lugar precioso no trabalho de partilha de memórias. A atuação com um registro interpretativo de representação dá a ver uma composição do personagem detalhadamente desenhado em cada traço psíquico e físico. A sutileza dessa composição faz com que se evidencie a carga pessoal da atriz no trabalho de adaptação da dramaturgia. É visível que a apropriação do mundo criado por Veronese desaguou na condição afetiva dessa atuação em cima do texto. Sem as memórias da atriz a força emotiva de Luisa não teria tanta concretude e apelo à expectação. Isso se dá de forma contundente nesse trabalho, pois na medida em que o personagem é representado pela atriz é possível verificar a carga biográfica do trabalho de atuação, principalmente ao colocar os objetos pessoais em cena, dialogar diretamente com o espectador e fazer dele seu companheiro de solo.



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Fotos: SECOM/Itajai - Victor Schneider
O grotesco nobre
Por Mariana Barcelos
Crítica do espetáculo Gueto Bufo, da Companhia do Giro.

Com direção artística, concepção e roteiro de Daniela Carmona e encenação de Élcio Rossini, Gueto Bufo, chegou a Itajaí depois de 15 anos de estrada. O espetáculo põe em cena duas bufonas, Vênus e Filó, duas mendigas, que tal como dupla de palhaços, se complementam em suas oposições.

Expulsas de lugares públicos por apresentarem comportamento inadequado, as duas encontram num gueto próximo a uma igreja o refúgio ideal para fazer pequenas encenações do cotidiano irônico das pessoas que as rejeitam. O cristianismo, a moral burguesa e a hipocrisia social são os temas das suas brincadeiras de cena. A dramaturgia, entretanto, não é criada em torno de uma linearidade narrativa, e sim do recorte de uma condição de vida, não se conta uma história, se exibe uma situação social. As peças ligadas à comicidade, que se fixam nos recursos do humor, da ironia e do grotesco têm sua forma distanciada da dramaturgia fundamentada nesta progressão linear. Esta sensação de truncado e inacabado faz parte da criação de estranhamento que o grotesco imprime e propositalmente provoca, como se tudo estivesse fora do lugar.

E está. A vida das bufonas está fora do lugar, está à margem do aceitável, do desejado. Por isso não importa se serão espancadas ou queimadas no final. Os mendigos não interessam, são alvos de projetos de “limpeza” institucionalizados, ou de diversão de jovens inconsequentes. O humor nasce então desse sorriso amarelo que aponta para a sociedade mesma, é um movimento de reflexão a partir do desconforto. O riso que vem do grotesco é meio perdido, do não saber o que fazer, não é uma proposta de riso por conformidade com a graça, ele é desesperado, desajustado, sem alocação. O grotesco cria rupturas de sentido e gera incomodo. O bufo é um grotesco por excelência.

Seu corpo aponta exageros, deformidades e vícios num lugar quase que inaceitável, que se protege na aceitação constrangida. Vênus, que ironicamente tem os braços amputados, como a Vênus de Milo, é grande, cheia de curvas carnudas e flores penduradas em seu figurino feito de restos encontrados no lixo, mas que a deixa feminina e sensual. Filó é corcunda, feia, tem dificuldade de fala e um figurino cinza. Como um recurso de complementação de opostos, quando estão representando suas pequenas cenas o jogo se inverte, Filó é quem mais fala, usa vestido e é autoritária enquanto Vênus recebe as recomendações. É um jogo bem construído, de quem tem uma vida inteira ao lado da outra, e muitos anos de atuação juntas do palco.

O grotesco, contudo, tem origem no teatro popular, nas ruas da Idade Média. Os mesmos bufões eram conhecidos em lugares diferentes e seus atores o apresentavam ao público durante toda a vida. Mas ali, na rua, não no palco italiano. Os que mais próximo chegavam das classes altas eram os bobos da corte. O espetáculo Gueto Bufo traz ainda estas duas características importantes de serem observadas: o protagonismo do bufão no palco “nobre” unido aos anos de carreira do artista popular.


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Fotos: SECOM/Itajai - Victor Schneider
O rosto no lugar da face
Crítica de Humberto Giancristofaro para a peça do Estúdio da Cena – São Paulo/SP

Pensemos nas articulações dos planos de imagem produzidas pela peça Odisséia. Alguns elementos especificamente dessa peça apresentam uma composição privilegiada para pensar o papel do rosto e até do close up no teatro contemporâneo. As expressões, os rostos, são usadas na peça como potência do falso. “Todos os seres vivos estão no aberto, manifestam-se e resplendem na sua aparência. Mas apenas o homem quer apropriar-se dessa abertura, apreender a sua própria aparência, o seu próprio ser manifesto. A linguagem é essa apropriação que transforma a natureza em rosto. Assim a aparência torna-se para o homem um problema, o lugar de uma luta pela verdade. [...] O rosto não coincide com a face. Por toda a parte onde qualquer coisa chega à exposição e tenta apreender o seu próprio ser exposto, por toda a parte onde um ser que aparece soçobra na aparência e a esgota, há um rosto. Assim, a arte pode dar um rosto mesmo a um objeto inanimado, a uma natureza morta. [...] E é possível hoje que toda a terra, transformada em deserto pela vontade cega dos homens se torne num único rosto”.

Odisseia segue esta construção de rostos para as cenas, mesmo as que trabalham em plano aberto, cheias de elementos, elas se compõem da junção de rostos em detrimento a uma face da história. O rosto de Odisseu estampado nos produtos, vendidos em cada esquina é o signo dessa operação que impeliu as imagens da peça para essa região do rosto onde o princípio de individuação deixa de reinar. Odisseu perde sua socialização e a comunicação com seu reino. Ele busca na sua jornada uma rostificação, uma reterritorialização do seu rosto e não suporta a desterritorialização que é feita dele, toda a liberdade e estado de fantasma, um duplo decaído de si e anseia por resgatar a ordem e estabelecer a sua medida como monarca de Ítaca. A Odisseia é um texto de descoberta do seu lugar no mundo e Odisseu combate a vida enquanto fluxo do acaso.

Odisseu trava uma batalha contra seu rosto projetado em canecas e chaveiros. Sua luta é contra isso que é desorganicizado – livre do organismo – e suplica para que o organizem. A percepção de um estado livre desses órgãos é insuportável para Odisseu, ele é um homem que só admite que os elementos se engendrem de uma forma, um rosto é um quebra-cabeça de boca, nariz e olhos para ele. Odisseu não vê a condição de captar esses elementos de outra forma, como a sensação de um rosto. “O rosto não é o seguimento exterior àquele que fala, que pensa ou que sente. A forma do significante na linguagem, as suas próprias unidades ficariam indeterminadas se o ouvinte eventual não guiasse as suas escolhas no rosto daquele que fala («olha, parece estar zangado...», «ele não pode ter dito isso...», «olha para mim quando te falo», olha-me bem...»). Uma criança, uma mulher, uma mãe de família, um homem, um pai, um chefe, um professor, um polícia não falam uma língua em geral, mas uma língua em que as tonalidades significantes estão indexadas em características específicas de rosto”.

Assim, o rosto de Odisseu não seria, meramente, um invólucro que cobre a cabeça como uma capa que faz sumir todo o suporte de determinação indexante, por aquilo que engendra uma tonalidade diferencial do que se dá como significativo na situação da cena, ou constitui-se nessa medida como a forma do significante. Nesse sentido, o rosto de Odisseu é o seu próprio espaço cartográfico de orientação de indicação que o guia, por fim, novamente até os braços de sua Penélope.

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  1. AGAMBEN, Giorgio, Moyens sans fins: notes sur la politique, trad. de Paris, Rivages, 1995, pp. 103-104) 
  2.  DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix, Mil Planaltos, Lisboa, Assírio & Alvim, p. 220


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Foto: Beto Bocchino
A tradição do Boi de Mamão
Crítica de Humberto Giancristofaro para a peça Alevanta Boi!

A curadoria do III Festival Brasileiro de Teatro Toni Cunha conseguiu reunir uma diversidade de manifestações culturais nessa edição de 2013. Diferentes linguagens foram contempladas para retratar a profusão do que o Brasil oferece, de cenários modernistas paulista à estética da seca da Paraíba.

O espetáculo Alevanta Boi!, participante da mostra local do Festival é uma demonstração das raízes da cultura do litoral catarinense. O folclore do boi é muito presente nas tradições regionais Brasil a fora, recebendo particularidades de cada lugar e sendo chamado de diferentes maneiras: boi bumba, bumba meu boi e como é denominado em Santa Catarina, boi de mamão. Os folguedos dessa manifestação cultural remontam a artesania da colonização açoriana na região. Como toda boa tradição brasileira, mistura música, dança e velhas histórias, nesse caso, ao redor da morte e ressurreição do boi. O boi pode trazer o significado de parceiro de trabalho no campo, dele depende o sustento das famílias, fazendo da sua figura algo de extremamente importante para as economias de auto-sustentação. Além dele, outros dois personagens são cativos da história: o Pai Chico e Catirina. Ela, com desejos de grávida, pede ao Pai Chico que lhe consiga a língua do boi para comer, caso contrário seu filho irá nascer com a cara “lambida”. O coronel aparece como dono do boi e, sem saber o que aconteceu com ele, chama um pajé para voltá-lo à vida. O ciclo se fecha quando o pajé diagnostica que apenas os encantamentos de uma grávida alcançam tal intento. Catirina é então responsável pela morte e pela ressurreição do Boi.

A linguagem utilizada para a concepção dessa peça foge, porém, de um modelo clássico de folguedos de rua. Procurando se aproximar um pouco mais dos recursos contemporâneos, ela lança mão de um boneco narrador que conduz a carruagem. Isto lembra consideravelmente a forma como os programas infantis de televisão são apresentados e dá um charme à peça que ajuda a manter a atenção dos espectadores na história. Esse narrador estabelece um laço interno com o drama, uma vez que se apresenta como o filho de Catirina. Ele é considerado também irmão do Boi, pois foi a chama da sua vida que alimentou a ressurreição do bicho. Ambos seguem conectados até que a morte os separe. Outra forma de jogar com o folclórico e o moderno se apresenta na figura do pajé, caracterizado como um índio apache típico dos filmes de wester americano. Dessa forma o apelo aos poderes xâmanicos do índio aparentam ficar mais expressivos para as crianças, ao invés de um índio “comum”, igual ao que elas veem pelas ruas. E ao fim da apresentação, que é toda feita em um carro de boi, o bonequeiro assume o miolo do boi e termina dançando bumba meu boi.


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Fotos: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
Uma dramaturgia atrás do efeito lúdico
Por Mariana Barcelos
Crítica de A Cortina da Babá, do Grupo Sobrevento

A curadoria do III Festival Brasileiro de Teatro Toni Cunha teve um olhar generoso para o Teatro de Bonecos. Boa parte da programação é dedicada ao gênero, que se divide em diversas linguagens, no Festival, por exemplo, pode ser visto desde os bonequinhos dos Lambe-Lambes, passando pelos bonecos com influência folclórica, que narraram a história do Boi-Bumbá, até a forma de manipulação Tangshan, tradicional no teatro de sombras chinês. Esta última foi apresentada no espetáculo A Cortina da Babá, objeto desta crítica.

O espetáculo tem sua encenação baseada no texto Nurse Lugton’s Curtain, de Virginia Woolf, no qual um babá dorme enquanto está costurando uma cortina bordada com animais e alguns elementos de uma aldeia, como uma ponte, e algumas árvores. O cenário de André Cortez é divido em duas estruturas de um mesmo quarto de criança, no lado maior está o menino, dono do quarto, na outra parte do tablado construído e colocado em cima do palco está a babá numa cadeira, segurando uma enorme cortina, embaixo de uma luminária. A divisão do quarto define o antagonismo dos personagens, que durante a primeira e última parte da peça se relacionam mais diretamente. O menino tem medo da babá, e a mesma se expõe de maneira rígida e controladora. Na primeira cena, um diálogo com sombras é proposto, com um brinquedo em forma de cabeça de dinossauro o menino simula morder a babá, logo depois, como resposta, usando a luz a luminária, a babá que parece engolir o menino. Cria-se assim os signos que definem esta relação, e anuncia-se o princípio de dramaturgia.

Contudo, após a cochilada da babá aparentemente a história é interrompida. O menino então passa a se divertir com sombras na parede, e mais adiante, numa espécie de delírio, vê os animais e figuras bordadas na cortina, contando pequenas narrativas na parede do seu quarto. Narrativas simples, um avestruz que põe um ovo vazio, uma árvore que perde as folhas, um balão amarrado na ponte que a leva para o céu. A manipulação dos bonecos ganha vida por detrás da parede iluminada por Renato Machado. A iluminação é indispensável no espetáculo por motivos óbvios, mas aqui ela vai além, quando nas cenas entre o menino e a babá é a luz que funciona como fala, já que estas não existem. É a luz que dá a densidade da relação entre as personagens e pontua as transições de ânimo tanto nos bonecos, quando nos atores. A iluminação é o elemento técnico que continua a propor uma dramaturgia mesmo quando a linha da continuidade narrativa é interrompida a favor da exibição da técnica.

O Grupo Sobrevento foi fundado em 1986, no Rio de Janeiro, por Luiz André Cherubini, Sandra Vargas e Miguel Vellinho. Em seu repertório figuram dramaturgos importantes como Beckett e Alfred Jarry, e, criações como em Mozart Moments, composta por alguns recortes da biografia de Mozart e ainda O Copo de Leite, destinado ao público jovem e que trata da transição da infância para a adolescência com todas as subjetividades e dificuldade presentes neste momento. São apenas alguns exemplos da complexidade dramatúrgica que o Teatro de Bonecos detém, porque, afinal de contas, é de Boneco, mas é Teatro. Não é hierarquicamente inferior a nenhuma outra forma de criação teatral.

Por escolha, ou não, já que não posso afirmar isto, A cortina da babá não apresenta na dramaturgia um desdobramento sobre a ação. Apesar da inspiração no texto de Virgina Woolf, a história que se exibe parece existir mais como pretexto para o teatro de sombras do que como componente mesmo da obra. Os momentos são independentes, a relação do menino e da babá é uma passagem, que somada dura pouco, e a maior parte da encenação é a exibição da técnica na parede do quarto. O que amarra uma parte a outra é uma linha de costura muito tênue e sutil, que se utiliza da repetição das figuras da cortina. Por isso, os momentos que os dois atores estão em cena têm mais profundidade cênica, mais tensão, mais força, e geram um interesse pelo o que pode se desdobrar dali em diante, ao contrário das sombras, que tem sua graça reduzida a forma em si, a girafa controla o pescoço e é isto. O tempo para o desenvolvimento da relação babá-criança fica encolhido.

O espetáculo, entretanto, tem um foco claro no público infantil. E não há questões quanto à importância de possibilitar este encontro com o teatro de animação, técnicas chinesas, bonecos, com a própria Virgínia Woolf e com o Sobrevento, um Grupo com reconhecimento consolidado dentro e fora do país e que tem um trabalho dedicado às crianças. Um privilégio.


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Fotos: SECOM/Itajai - Victor Schneider
A camada humana do boneco
por Dâmaris Grün

Um príncipe chamado Exupéry da Cia Mútua de Teatro, alicerçada companhia itajaiense conhecida pelo público local por seu trabalho com as formas animadas do teatro como a manipulação de bonecos, o teatro lambe-lambe o show de mágica, e etc., caracteriza-se por certo hibridismo bastante interessante: a interação do humano com a matéria amorfa do boneco a partir de uma manipulação que atua não somente no objeto manipulado, mas também atua no todo do espaço cênico que divide com o espectador.

O espetáculo narra a história de Antoine de Saint- Exupéry, na fase anterior ao trabalho como escritor de O pequeno príncipe, quando esse foi carteiro aéreo entre os anos de 1926 e 1944, voando desbravadamente em escalas pela Europa, África e América do Sul. Suas aventuras como “entregador” de encomendas, cartas, mensagens entre continentes é contada numa ótica extremamente afetiva.

Para ambientar essa história da forma mais lúdica e afetiva possível, a direção, acredito, optou por uma ambientação para além do espaço convencional da manipulação dos bonecos, uma vez que a plateia está dentro do espaço da cena por assim dizer. A relação é frontal, mas a área toda cenografada, que reproduz um hangar, possibilita que o espectador seja abraçado por aquele universo e se confronte com a história ali contada de forma mais cúmplice, com uma maior proximidade. Um vínculo afetivo entre cena e expectação é suscitado pelo espetáculo na medida em que ele permite que o espectador acompanhe a narrativa não somente contemplando a animação dos bonecos manipulados em cena, mas criando laços ao dividir o mesmo espaço que bonecos e manipuladores.

Assim que se chega ao espaço da cena o fictício correio postal dentro do hangar coloca o espectador imediatamente nas páginas de um livro de histórias infantis, de aventuras. Uma atmosfera lúdica e nostálgica inebria o sujeito e estabelece uma cumplicidade verificada em seguida com os manipuladores, com os bonecos e com o que é contada ali, uma narrativa visual destituída da palavra. Essa cumplicidade é muito marcada no tipo de relação que os manipuladores, Monica Longo e Guilherme Peixoto, imprimem ao trabalho ao se dirigem diretamente à plateia, ao não se ocultarem no boneco, mas evidenciar sua presença e o caráter de representação na atuação, ao evidenciar os movimentos artificiais manipulados por uma mão humana que confere certa organicidade aos bonecos. Os dois não usam as tradicionais vestimentas pretas que ocultam o trabalho de manipulação para que se destaque somente o boneco, mas sim um figurino realista, de um aviador da primeira metade do século XX.

Os fios de humanidade que contém cada andar hesitante desses personagens marionetes das mãos dos atores/manipuladores são a grande chave do presente espetáculo. A brincadeira jocosa que eles estabelecem diante da (e com a) plateia é sempre viva e dá um sentido que muitas vezes não se vê nesse tipo de trabalho, que é uma aproximação com a recepção, um olhar menos distanciado diante do objeto. Ao espectador é feito um apelo para que mergulhe na história e se familiarize com aquele mundo mágico da animação que presta uma homenagem ao criador de um dos personagens mais conhecidos da literatura mundial.

Acredito que a direção do espetáculo, de Willian Sieverdt, não procure no trabalho a perspectiva da demonstração de um teatro de animação de excelência na manipulação técnica ou para o preciosismo de bonecos e adereços da cena. Nem deseja somente contar aquela história por essa linguagem. Há no trabalho a natureza do encontro presencial que sela uma aliança entre cena e expectação. O hangar cenográfico, de Jaime Pinheiro, não só oferece aconchego aos espectadores como dinamiza a carga humana dos bonecos e principalmente, cria uma importante proximidade com a narrativa linear que tem um começo, meio e fim. Os olhares cúmplices entre bonecos e atores reverberam na expectação que assim se deixar livremente voar através dessa viagem teatral animada pela figura cativante do aviador Exupéry.


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Fotos: SECOM/Itajaí - Jonnes David
Baile de Máscaras de um Império em Ruínas
Crítica de Humberto Giancristofaro sobre a peça do Grupo Bagaceira, Fortaleza – CE.

Seguindo a sua linha provocativa, o Grupo Bagaceira, apresentou no III  Festival Nacional de Teatro Toni Cunha, a peça Por que a gente não é assim? Ou Por Que a Gente é Assado? Ela trata da experiência desafiadora de agarrar uma identidade em meio ao turbilhão da vida. Seus personagens, sempre fragmentados, descobrem a inviabilidade de se afirmar por uma característica essencial e, assim, se lançam num baile de máscaras e se confrontam com o eterno lema: “eu tô mudando”.

“Eu tô mudando” é uma condição de possibilidade do homem contemporâneo para se entender com a sociedade. As velocidades, as prioridades, os olhares, os recortes, etc. mudam tão vorazmente a cada instante que é impossível dizer, assim na lata, eu sou isso ou eu sou assado. A vida acontece à revelia e os acontecimentos, mesmo aqueles dos quais fazemos parte, escapam das nossas mãos o tempo todo. Como é o caso do personagem da peça que alcança a efêmera fama de artista da semana na internet com seu vídeo viral. Ele só não consegue descobrir, porém, qual é o conteúdo desse vídeo que alçou sua personalidade. O reconhecimento desse estado de mudança como projeto de vida é a grande força criativa/ criadora que desponta na nossa geração. Isso se dá exatamente por ir de encontro com ideais que exigem o atestamento de uma identidade própria (portar códigos de barras imutável) – veja o desconforto da parcela conservadora com aqueles que cobrem as caras nas manifestação, tentando apenas se salvar ou do gás lacrimogêneo do momento ou das câmaras de gás em que suas identidades serão enfiadas. A peça é um deboche às tentativas pueris de conter as aparições da mudança por meio de regras, rótulos, reuniões, agendas e consumos. Tudo na tentativa de tratar os indivíduos como multidão, ou massa de manobra, e encaixar a todos num curral.

O fato de essa peça acontecer na rua é especial. Ela explode para além da plateia e para além de um teatro e alcança os transeuntes, mesmo aqueles que recebem apenas um fragmento dela. Com um pedaço dessa arte, o transeunte-agora-espectador recebe mais uma referência em sua vida, só que esta é uma referência viral, no sentido de que ela serve para por em questão o que fazer com todas as outras referências que agarramos. O que fazer com todas as referências que são postas no nosso colo? Como devemos agir diante das novidades que ululam nos nossos celulares, tablets e gadgets sem fim? Quem devemos ser com tudo isso? Como formar um pensamento que se referencie a tudo isso que acontece? Por que a gente não é assim?... é uma peça que pede calma e oferece um olhar bem-humorado sobre essas exigências. Uma apologia ao always look the bright side of life dos nossos tempos.


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Fotos: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
Solitários enlaces
Por Dâmaris Grün

O espetáculo "Porque não estou onde você está" fala de presenças ausentes que ocupam o mesmo espaço, de um casal sem afeto aparente que inventa regras fixas de convivência para poder suportar as agruras de um casamento torto e marcado pela presença de uma terceira figura, desestabilizadora e fantasmagórica, que confunde os sentimentos dos personagens Homem e Mulher, que habitam um casamento de “milímetros, de réguas”.

Baseada na obra Extremamente Alto e Incrivelmente Perto de Jonathan Safran Froer, romance que aborda a ausência de um pai na vida de seu filho ao serem separados por uma tragédia, a dramaturgia de Maira Lour capta a premissa temática da “ausência” do livro e transpõe a história para um casal que estabelece regras convivais que não podem ser quebradas, tais como nunca perguntar como o outro está, como foi o seu dia, nunca ser gentil nem mesmo demonstrar qualquer sentimento, e etc. Todo narrado pelos atores, com diálogos pontuais que carregam um sentido narrativo que vai aumentando a distância entre aquelas subjetividades, o que impera é uma frieza que se materializa no estatuto de regras por eles criado e na relação que estabelecem com o terreno do lar: demarcações milimétricas, retas, quadrados que beiram a cama, filigranas de olhar que beiram o ocultamento do outro no campo de visão do casal. Lugares “nada” por eles denominados e preenchidos por personagens extremamente solitários. Dentro dessa convivência completamente estática no afeto (do não saber dizer “Eu te amo”), no ocultamento de um pela presença do outro, deflagra-se o tempo inteiro a personagem Anna, que sintetiza a capacidade de amar de ambos, o amor fraternal que se confunde com paixão da Mulher por ela e o arrebatamento juvenil da paixão do Homem.

O texto tem ainda um fundo histórico, já que a presença de Anna em cena remete a alguma guerra - que pode ter sido a 2ª Guerra Mundial já que os figurinos tem uma modelagem que beira os anos 50 – em que ela se torna vítima fatal. Assim, a personagem aparece como uma rememoração, sempre num plano da memória do casal, como uma memória compartilhada e estraçalhada pela tragédia da guerra.

É interessante atentar para o fato de uma pretensa capacidade de expressar os sentimentos e sensações do casal só se dar na relação que ambos estabelecem, em tempos discrepantes, com Anna. Essa personagem aparece num plano da memória, mas é dentro dessa materialização que somente é possível ver uma relação mais pessoal e intensa de sentimentos do casal. Isso porque a aparição de Anna espelha a incapacidade de comunicação entre esses seres e, principalmente, a impossibilidade que eles têm de enunciar "Eu te amo". Isso porque nenhum personagem, aqui, nessa história, está presente onde o outro habita: o casal vive num mesmo espaço cotidiano, mas nunca estão juntos ou se permitem estarem. E a figura fantasmática de Anna opera uma cisão: é impossível aquele passado se estabelecer, pois ele é fruto de uma inadequação do casal ao presente, pois ele está amarrado às lembranças de um porvir que não se deu. Da mesma forma que o passado é alento aos dois, é uma regra estabelecida não o mencionarem, não falarem nada sobre ele ou revê-lo juntos. Dentro dessas impossibilidades comunicativas e emotivas que se materializam nessas não presenças, a metáfora da impossibilidade de ver o outro e estar ao lado de alguém de forma verdadeira é a grande chave desse espetáculo. Porque não estou onde você está é uma condição afirmativa do texto e da encenação, a conclusão do que vemos em cena carrega somente uma metáfora redentora: a libertação que o extravasamento dos afetos possibilita através do ato de soltar os bichos que o Homem cria em gaiolas e armadilhas.

A encenação de Maira Lour dialoga diretamente com a relação da ausência e frieza nas regras de convivência do casal. Na forma narrativa da dramaturgia as distâncias entre os personagens se estabelecem de forma límpida e proposital, e mesmo a palavra falada possui um caráter quase declamatório, que invariavelmente coloca o espectador em contato com o estado daquela situação. É por esse viés amorfo de emotividade que o espetáculo conserva uma dinâmica coreografada na fala, nos diálogos e no registro interpretativo marcado por gestos. Esses gestos substituem palavras que somem e que não podem sequer serem ditas, tamanha a distância que os milímetros daquelas regras impõem ao casal. Mesmo na relação mais direta, que se dá com a personagem Anna, tanto do Homem como da Mulher com ela, a contracenação se dá numa formalização dos sentimentos, através desses gestos secos e de movimentos coreografados que delimitam uma artificialidade daquelas relações, como no momento específico da primeira relação sexual entre Anna e o Homem por exemplo. O caminhar reto e estacado tira qualquer possibilidade de aconchego na recepção daquela história. É em milímetros, réguas, quadrados, gaiolas que estão presos aqueles estados d’alma. Assim, a escolha da direção, me parece, repousa na verificação cênica da frieza que emerge do conteúdo dramatúrgico. Reverberando assim em uma montagem extremamente formal e distanciada entre as atuações na cena e em como se verifica esse jogo com a plateia. Sobre esse dado do distanciamento nas atuações é possível aventar uma nesga de cumplicidade com a expectação na medida em que a ela se dirigem os personagens ávidos em comunicar aquilo que podem com o outro em cena. Esse é o jogo com a plateia, e ele faz um contraponto simbólico com a problematização da comunicabilidade nas relações entre as pessoas.

O desenho de luz de Beto Bruel recorta o espaço e delimita os sentidos daquela história em tomadas eficazes para aquelas situações. Os quadrados de branco que incidem em todo o espaço da casa, que se limita a uma cama, uma mesa com cadeira e uma máquina de datilografar, presentificam a coisa do milímetro, do “casamento de réguas” na visão dos próprios personagens. Assim como as gaiolas penduradas no cenário apresentam a metáfora do aprisionamento daquelas individualidades aos padrões por elas determinados. Esse desenho de luz permite espaços compactados por uma claridade sempre sombria, capaz de estabelecer sujeitos ocultados na visão espacial de cada um, encobertos, milimetricamente retidos em seus espaços “nada”. É importante destacar que a luz nas aparições de Anna é mais aberta, um âmbar que desenha uma materialidade mais onírica e de rememoração.


Porque não estou onde você está é um trabalho que possui um ano e meio de estrada e no qual se pode ver a busca da jovem Súbita Companhia de Teatro de uma singularidade formal e de tratar de questões que interessa aos seus integrantes. Na tentativa de cavar seus espaços no teatro e nas diversas linguagens que ele possibilita temos aqui um trabalho que tem uma cara e, principalmente, que é dado dentro da perspectiva de jovens sedentos pelo fazer teatral e pela pesquisa cênica.


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Fotos: SECOM/Itajaí - Jonnes David
A mitologia e o Lambe-Lambe
Por Mariana Barcelos

Os Lambe-Lambes na praça e o público que se posiciona em fila e sabe esperar. Em Itajaí a tradição se mantém. Na tarde do dia 02 de setembro, ao lado da Casa de Cultura Dide Brandão, os três caixeiros do teatro de animação Mistério de Elêusis se posicionaram com seus figurinos e caixas decoradas e deram início à apresentação. Alguns passantes perguntavam curiosos do que se tratava, e aguardavam na fila para descobrir o que era. O Lambe-Lambe tem este nome por inspiração nos fotógrafos lambe-lambe do início do século XX. O formato da caixa de apresentação se assemelha mesmo a uma grande câmera fotográfica , e de certo modo o que se vê é uma sucessão de fotografias animadas. A imagem é uma ligação que não se perdeu.

Os caixeiros, que manipulam e apresentam os episódios/cenas da história, deixam a mostra o laço que os une além da caixa: a luva. Por vezes a luva é um personagem, e nesta fábula, seus detalhes pretos em couro serviram bem à Hades, deus do mundo dos mortos. Os Mistérios de Elêusis fazem parte da mitologia grega, e consistiam em rituais que celebravam as deusas Deméter e Perséfone (mãe e filha). O laço parental era tão forte que, após o sequestro de Perséfone por Hades, a terra passa por bruscas transformações na geografia do tempo. Por meio da mediação de outros deuses junto a Hades fica estabelecido que Perséfone passará metade do ano com a mãe, metade no mundo dos mortos. Deste movimento de subir e descer nascem as estações do ano. Junto à mãe, na terra faz primavera e verão, quando com Hades, na terra tem o outono e o inverno. Na mitologia, a mudança do tempo é fruto do afeto.

E o Lambe-Lambe tem aqui esse lugar de um didatismo divertido , de falar da mitologia, e de unir duas tradições. As três caixas estão divididas em: O rapto; Hades; Perséfone. Cada caixinha apresenta um mini espetáculo de três minutos para um só espectador. A manipulação dos bonecos é feita em frente a uma projeção simples e poética que representa os lugares onde as personagens se encontram, ora terra, ora Hades. Na terra tem uma árvore, no Hades uma parede de pedra. As metáforas são objetivas e excluem a voz em off, a informação oral, no fone de ouvido dado ao espectador antes da apresentação o que se escuta é uma trilha sonora. A trilha é reiterativa do estado de ânimo de Perséfone entre a terra e o Hades, e mais tarde torna-se fundo musical das estações do ano.

As caixinhas têm alguns recursos tecnológicos, como o fone de ouvido, as projeções e alguns efeitos simulando focos de iluminação. A narrativa é construída principalmente por tais recursos, os bonecos (e a mão de Hades) formam um encanto a mais. É interessante porque as caixinhas estão em frequente transformação. Mas o que se revela, como filme de fotografia, por detrás do buraquinho pelo qual olha o espectador é algo de muito mais antigo e sem fim: o encontro com a curiosidade.


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Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
A parte calma da infância
Crítica do espetáculo Cabeça de Vento, da Pandorga Companhia de Teatro
Por Mariana Barcelos

Há um quê de repetição nos espetáculos infantis. Muitas cores, muitos sons ilustrativos, muitas caretas, muitas vozes artificiais, muita correria. Fica a impressão de que pensar na recepção da criança é sempre correr atrás da sua concentração a todo custo, não importa o que se conta. Com algumas exceções, as representações das fábulas pecam por um didatismo exagerado, que acabam por recair no clichê do “estar subestimando a inteligência das crianças”. Este é um problema que Cabeça de Vento, com texto e direção de Cleiton Echeveste, não apresenta.

Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
O espetáculo se mostra aos poucos, em princípio o registro de interpretação mais próximo do natural, vozes sem grito, sem grandes articulações, sem falseamentos e o corpo sem movimentos irreais causam algum e estranhamento: “É realmente infantil?” Perguntavam algumas pessoas na plateia. O fato é que um pai, uma mãe e um menino que ama soltar pipas se refere intrinsicamente ao universo da criança. A rachadura de sentido se abre neste exato momento quando o imaginário é infantil, mas a representação não é, ou nem tanto. O questionamento que a peça propõe sobre a parte técnica do teatro é: existe mesmo uma forma de interpretação só para um público-criança? Alguém disse isso? Eu, particularmente, conheço pouco a literatura teórica sobre teatro infantil, então, não sei se este ponto que levanto já é uma discussão fluente entre os grupos e pessoas que trabalham com este teatro. Como espetadora, estudante, e professora de teatro para crianças, eu penso que a multiplicidade de linguagens do teatro feito para eles mesmos não é só um ganho do ponto de vista técnico, mas uma maneira de demonstrar respeito a um público que também deve ser visto em sua heterogeneidade. Quando os espetáculos infantis são repetidos dá a impressão de que as crianças são também.

Pois bem, o espetáculo começa com a apresentação dessa estrutura familiar (pai – Eduardo Almeida, mãe – Tatiana Henrique, e filho – Jan Macedo) tendo uma vida comum, até que um dia um acontecimento também comum coloca a vida de Leonardo e sua mãe num período de transição, assimilação e aprendizado: o pai morre. Não é um drama, um horror, uma fatalidade, é algo que ocorre a todos, ou quase, mas é comum, normal, e pode ser tranquilo. Mais uma vez o espetáculo ganha na não obviedade do tema, na maneira de se colocar para seu público com generosidade diante de um assunto difícil, porém sem desacreditar na capacidade de apreensão dos meninos. Leonardo tem 8 anos e sente dificuldade de compreender o momento, como a mãe perplexa que sem saber como tratar e o que dizer dá a Leo um livro de presente, um almanaque sobre figuras históricas, para que ele se distraia.

Com isto o espetáculo adquire uma atmosfera serena, calma, tranquila, uma espécie de suspensão comum a períodos em que a vida passa por transformações importantes. A direção e as opções técnicas da montagem dão a sensação de que Leo tem todo o tempo do mundo para viver este processo. A trilha sonora de Gustavo Finkler tem uma qualidade relaxante, mansa, um pouco lenta, e tem uma presença forte durante toda a encenação. Ela permite quebras reflexivas entre uma fala e outra, o que contribui para o efeito de um ritmo lento de espetáculo. Eu poderia pensar que talvez isso fosse um ponto de se estudar melhor a execução, mas me recordo de uma ida recente ao teatro, em que o espetáculo era muito poético e também me deixou uma percepção de lentidão. No final, uma espectadora me disse: “Muito bonito, né? Tranquilo. A gente não está mais acostumado com isso. Estou tão calma.” Na verdade, minha intenção é dizer que talvez o ritmo seja uma questão de costume. Neste caso, claro, em que a encenação se apresenta da mesma forma do início ao fim.

A iluminação de Tiago Montovani é igualmente recurso para este estado contemplativo. Ao deixar prevalecer tons frios e discretos os véus brancos da cenografia de Daniele Geammal, que ficam em paralelos na rotunda, ficam tingidos em degrades oníricos, fantasiosos, que contribuem para uma apreensão mais sinestésica da obra. As crianças menores, que podem não ouvir o texto com muita clareza de sentido, têm como experenciar um encontro mais estético com o espetáculo. O cenário é composto ainda por modulares com bases retangulares nos quais muitas varas de bambus estão encaixadas, a movimentação é intensa desses modulares durante a peça, muitos formatos são propostos durante as cenas. Quando assisti, não consegui captar uma lógica naquela utilização, apenas fiz os links óbvios do bambu com a pipa e com a personagem oriental que falarei mais adiante. Contudo, ontem durante uma conversa com o grupo, foi dito que os modulares foram construídos com a ideia de montagem, como um jogo de Lego, com possibilidades infinitas. Esta parte minha idade não permitiu enxergar.

Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
Então Leo ganha o livro e vai passear. No meio do caminho acontecem coisas incríveis, alguns personagens do almanaque aparecem e conversam com o menino. Benjamin Franklin, Fu Hao e Ricardo Coração de Leão têm em suas histórias ligações com pipas, é daí que parte a justificativa dramatúrgica, mas para o menino ficam os aprendizados de coragem e a sabedoria de esperar o tempo passar. O encontro com essas figuras traz o elemento fantástico e ao mesmo tempo didático do teatro infantil. É atraente a utilização dos sotaques que estes personagens trazem, assim como algumas falas ditas em outras línguas, sem a menor intenção de explicação ou tradução do que se está sendo falado. A criança tem autonomia como espectador de assistir conforme suas possibilidades, não tem ninguém a obrigando o entendimento. É assim que se forma um espectador não passivo.

Espetáculos infantis vêm com a propaganda de ser “para toda a família”. Claro, não há nada impróprio para um adulto nessas peças, e é preciso de acompanhantes, no fundo, é isso. Mas vamos pensar mais além em Cabeça de Vento, o espetáculo alarga as fronteiras do que pode ser um infantil; e fala de um tema que nós, ocidentais, ainda estamos longe de ter um encontro saudável; ainda propõe para a infância um lugar menos elétrico, enfim, são muitos os interesses. E principalmente, ver a inocência afastada da cegueira é uma necessidade, é uma alegria.


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Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
Deslimite
Crítica de Humberto Giancristofaro para a peça Pequeno Inventário de Impropriedades, da Téspis Cia. de Teatro – Itajaí/SC

Um homem comum, uma vida comum, um cotidiano comum. Em meio a tanta previsibilidade, adormece qualquer vontade de realização e o personagem da peça Pequeno Inventário de Impropriedades se repete na sua vida ordinária. Mas o que é preciso fazer, ou pelo que é preciso passar para que a vida seja chacoalhada e um novo animo tome conta do seu ser? Com este homem, uma cadeia de violências, transformam o pacato senhor em uma besta fera, cheio de energia e potência. Violências, porém, que se revelam cotidianas e formadoras da vida. O ator e dramaturgo Max Reinert constrói esse personagem expondo a intimidade de seu pensamento. Esse é o dispositivo principal da peça, misturar o universo interior do pensamento com o das ações. Dentro da cabeça, esse homem vai descobrindo que pode mais do que sua coragem lhe permite. Aos poucos, a força desses pensamentos conferem energia para modificar as decisões e as suas ações. A direção de Denise da Luz opta por ir revelando aos poucos essa transformação para que ela seja plausível e não cause um distanciamento do publico, por maior que seja a estranheza que surja, o espectador é sempre levado a confiar naquele personagem.

Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
O dispositivo que coloca no mesmo nível pensamento e ação faz a realidade parecer duvidosa. Em alguns momentos não se sabe se o que estamos assistindo é uma ideia escondida no fundo da mente daquele homem ou se ele realmente passou por aquilo. Como é o caso de sua internação num hospício, não se sabe se esse é um medo ou um fato na vida do personagem. Mas uma coisa é certa, mentalmente ou fisicamente tanto faz, ele passa por essas experiências que deixam marcas na sua vida. Essa é uma questão forte da peça: mesmo o que é imaginado tem seu nível de realidade. O auge dessa mescla que confere materialidade ao pensamento é vista enquanto o personagem sonha. Ele devaneia com cavalos toda a noite, ilustrando a sua fobia da vida. Essa imagem pode ser equiparada ao caso clássico do pequeno Hans, paciente de Freud que projetou para o medo de cavalos toda as suas inseguranças, especialmente as relacionadas a figura de seu pai.

Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
Na peça Pequeno Inventário de impropriedades o personagem com sua incapacidade de sentir qualquer coisa - ele não sente nada pelos filhos, pela mulher, nem por ninguém - supera sua fobia pela sua transformação em um devir-cavalo. O personagem aparece vestido com a cabeça de um cavalo e, a partir dessa metamorfose, ganha forças para atuar cada vez mais de acordo com seus pensamentos. Ou seja, abre espaço para eliminar a mesmice da sua vida e passa a se tornar cada vez mais violento. A violência, porém, não é vista aqui de forma pejorativa, é uma violência para romper as amarras e possibilitar uma nova posição diante a vida.

Outro dispositivo utilizado por Max em seu texto é a inserção de narrações. Elas servem como um referencial, como uma voz de fora da realidade daquele personagem que tem o poder de guiá-lo, de ajudá-lo a se posicionar e se expressar com mais exatidão. A narração é uma voz da consciência que o leva a concluir que “nos igualamos na dor”. Com esse reconhecimento a peça fecha o seu ciclo, no qual o personagem não se vê especial porque sofre, ao contrário ele é comum por sofrer as mesmas dores que todos passam e é isso que nos irmana.



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Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
A construção imagética precisa de um mundo
Crítica do espetáculo O Rio, do Teatro didático da Unesp e Teatro de Brancaleone – São Paulo
Por Dâmaris Grün

Por trás do que lembro,
ouvi de uma terra desertada,
vaziada, não vazia,
mais que seca, calcinada.
De onde tudo fugia,
onde só pedra é que ficava,
pedras e poucos homens
com raízes de pedra, ou de cabra.

Os versos acima são do poema narrativo O rio ou Relação da viagem que faz o Capibaribe de sua nascente à cidade do Recife, do poeta João Cabral de Melo Neto, publicado originalmente em 1953. Em linhas gerais o poema trata da viagem que o rio Capibaribe faz desde sua nascente no interior de Pernambuco até seu deságue no mar do Recife. É possível encontrar nessa poesia todas as características recorrentes na obra do poeta pernambucano, o rigor estilístico, a rima compassada e etc., bem como a temática da seca, do curso das águas, dos retirantes, dos canaviais, da fauna e flora da catinga e dos canaviais, por exemplo. E é a partir desse poema que materializa uma visão geral de um universo regional descrito pelo autor, que o Teatro Didático da Unesp e Teatro de Brancaleone abre a terceira edição do Festival Brasileiro de Teatro Toni Cunha, em Itajaí, apresentando O Rio, espetáculo com alta precisão técnica e um refinamento de imagens que dão a ver o universo impactante da realidade descrita nos versos do poeta recifense.

Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
Antes de falar do espetáculo considero importante traçar uma brevíssima síntese do grupo: gerado dentro da Universidade Estadual Paulista, a Unesp, o Teatro Didático possui 20 anos de existência e é capitaneado por Wagner Cintra, professor do Instituto de Artes dessa universidade e diretor do espetáculo. Voltado para o teatro de pesquisa nas áreas do teatro de animação, de bonecos, e com um intenso diálogo com as artes visuais, a trajetória do grupo é bastante consistente, visto seu repertório e a participação em diversos festivais de teatro pelo país, e focada no rigor técnico da visualidade da cena. No primeiro contato que se tem com a cena de O rio é possível verificar uma precisão e um apuro, que é de ordem artesanal, dentro da linha de pesquisa em que estão empenhados. Digo isso porque verifico um alto nível na técnica de construção dos elementos de animação, de cenografia e caracterização desse trabalho, que resulta numa formalidade que não deixa arestas aparentes. É possível, assim, ver impressa a trajetória intensa de estudos, e todas as tentativas que geraram em acertos e possíveis erros, no resultado final do trabalho – entendendo aqui resultado não como um juízo de valor, de algo bom ou ruim, mas de fim pretendido dentro de um horizonte de expectativa artística - que transcorre sem falhas, sem tropeços técnicos. Isso está diametralmente ligado ao percurso acadêmico e longevo do grupo. É notável tal característica, pois é de dentro do laboratório acadêmico que o grupo constrói os artefatos cênicos que dispõem em cena, construídos a partir de materiais viáveis e eficazes como pó de cortiça, papel, fita crepe, exemplos de matérias-primas simples, de baixo custo, reutilizáveis e com o apelo lúdico para a construção do universo pretendido nesse tipo de trabalho e na natureza da encenação de O rio. Essa questão de apuro técnico relacionado à pesquisa intensa de longa data e verificada em cena está evidenciada na própria ficha técnica do espetáculo: o grupo assina as rubricas de cenografia, figurino, desenho de luz e dramaturgia, rubricas técnicas que retificam um trabalho preciso conjunto.

A cenografia se reduz a um chão coberto pelo pó de cortiça que materializa o chão agreste e ocre descrito na poesia de Cabral de Melo Neto. A sua amplidão no espaço ganha um horizonte com o fundo preto do palco. Há no centro um grande cubo central, pedregulho ocre e que gira como o globo terrestre e que contém em si a metáfora do mundo descrito na viagem do rio, da paisagem seca, vazia, vaziada, duro e cru do poema. Da rotunda caem farelos insistentes do mesmo material de que é feito o chão – a imagem de uma terra seca, arenosa - que banham o cubo e calcinam o caminho do rio e de suas gentes. As imagens do homem esqueleto, do boi seco, do homem que possui uma pela que se confunde com essa terra reiteram esse universo poético da natureza valente do sertão e dessa figura humana que dela emerge e que é muito pulsante na obra do poeta.

Foto: SECOM/Itajaí - Victor Schneider
As figuras e imagens que operam uma decodificação rápida do contexto regionalista e social também dividem a cena com os bonecos manipulados pelos atores que, por sua vez, carregam um significado mais neutro, na medida em que engendram a visão do ser/figura humana que caminha, como o rio que anda por um caminho tortuoso, cheio de imprevistos e segredos. Como, a título de exemplo, o momento em que um boneco extremamente pequeno em relação ao espaço da cena e do palco, caminha por cima de um cubo idêntico ao cubo central, porém em menor escala, dando voltas incessantes, capturando a metáfora de a vida ser esse eterno caminhar do homem em busca de um futuro desconhecido, mas promissor. Todo esse repertório imagético e cênico é banhado por uma luz que faz recortes precisos dos elementos na cena e captura uma atmosfera solar que destaca e abraça aquele mundo repleto de imagens fortes.

É por esse registro imagético pulsante do mundo particular encontrado na poesia de Cabral de Melo Neto que o espetáculo exige do espectador a disposição para uma apreensão das imagens que gere numa construção particular e subjetiva de cada indivíduo da expectação. A narrativa do poema em cena se esvai e esgarça dando a possibilidade de o espectador construir sua própria narrativa lírica pelos desenhos na cena. Logo, o espetáculo tem um ritmo compassado, como os versos de O Rio, e a direção não procura dar conta da transposição total da narrativa poética. O que fica evidente é o desejo de partilhar um universo capturado pela leitura daquele objeto textual e que opta pelo jogo da força das imagens figuradas da cena para o espectador. Aqui nessa experiência, a palavra falada aparece em alguns trechos do espetáculo somente em off, mas em raros momentos, o que solicita do espectador um olhar mais atento às imagens construídas em cena pelos atores/manipuladores e todos os sentidos que elas possam dar. Dessa forma, a palavra que é matéria anterior e precede a imagem material é como que dispensada, pois é substituída por uma narrativa visual contundente.

É muito importante destacar os corpos atentos e vivos dos atores/manipuladores que se apresentam em cena de forma límpida e concisa, com uma rigidez formal que se relaciona diretamente com os bonecos por eles manipulados. Isso porque uma intensa fisicalidade dos atores interfere na visualidade dos bonecos e vise e versa, são potencias físicas em cena que se relacionam e tomam diversas proporções no espaço amplo da cena. São naturezas absolutamente opostas que dialogam sutilmente para dar a ver aquele universo metafórico e visualmente rico para o espectador.

Considero a transposição do gênero poesia para a cena trabalho difícil, árduo, em que nem sempre se consegue estabelecer um contato profícuo com a expectação, ficando muitas vezes um lirismo solitário da cena e na cena, que não compactua de alguma forma com a subjetividade do espectador. Trazer todo um universo para cena e deixar que o espectador construa seus referenciais e imagens virtuais a partir de um banco imagético altamente técnico e rigoroso é característica marcante no trabalho do Teatro Didático da Unesp e Teatro de Brancaleone em O rio. É uma experiência satisfatória desse encontro de mundos. Tendo o poema como pedra angular em O rio vê-se todo um universo poético em cena que dialoga sim com o público, na medida em que permite que esse faça sua leitura de mundo a partir de uma carga visual apresentada com rigor técnico. E me parece fundamental que esse jogo possa permitir que o próprio ser/caminhante/espectador possa transpô-lo e ir além das subjetivações possíveis de serem captadas pela arte.

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